sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Pesquisas de EM no Brasil


Bom, e depois de uma noite muita bem dormida de descanso e de um belo café da manhã, partimos para o Congresso Nacional... aquele local "singelo" que eu descrevi dois posts atrás...
Como toda criança grande, fiquei com cara de "uau" ao entrar numa plenária no prédio da câmara federal. Aquelas bancadas com os microfoninhos que a gente tá acostumado a ver os deputados se tratarem como "excelentíssimo senhor deputado filho da puta"... é bem marcante no início.
Com algum atraso, o Encontro foi aberto pelo deputado José Luiz Penna, que, adivinhem, é acusado de corrupção (grandes novidades, né?). Não votei nesse cara e é muito provável que não vote nele nunquinha. Mas, não fosse o deslize dele ao dizer "como eu nasci na primeira metade do milênio passado", até que ele falou bem. Mas nascer no milênio passado? Tudo bem que ele é velho, mas não é Matusalém... hahahaha.
E, falando em deslize, eu cometi o deslize de anotar que a primeira fala era da Presidente da Academia Brasileira de Neurologia e não ter anotado seu nome (pensei que tinha escrito no programa do encontro, mas me enganei). Catando pelas internets, achei o nome, Dra. Elza Dias, mas pode estar errado, então, quem esteve por lá, me corrija. O que ela disse foi que a Esclerose Múltipla passou, nos últimos anos de uma doença desconhecida, que era "ensinada" em meia hora de aula nas escolas de medicina, para uma doença encarada como algo a ser profundamente estudado em nosso país. Os médicos estão percebendo que a Esclerose Múltipla é um problema brasileiro. Além disso, hoje em dia é uma doença com critérios de diagnóstico bem definidos, e que os exames disponíveis aumentam as possibilidades de um diagnóstico precoce. Isso é uma grande vantagem, já que, com diagnóstico precoce pode-se fazer um tratamento precoce. E, quanto mais cedo começarmos a tratar a doença, menos riscos e sequelas vamos ter também.
Resumindo sua fala: estamos num bom caminho, mas ainda há muita estrada a percorrer.
A partir daqui, faço um resumo sobre o que foi dito pelos médicos que pertencem ao BCTRIMS, porque muitos falaram as mesmas coisas com palavras diferentes.
O Dr. Marco Aurélio Lana falou que temos que criar, adaptar os cuidados aos pacientes brasileiros. E, por isso a importância dos médicos, pesquisadores e portadores terem um diálogo com o poder público. Bem sabemos que, muitas vezes o que nos falta é uma assinatura. E que muitas vezes o que nos atrasa é a burocracia. Mas que também, essas coisas são necessárias para o bom funcionamento de uma nação. O nosso grande problema e maior solução (aí é opinião minha), continua sendo as pessoas.
E foi com essa apresentação que se deu início o Encontro.
O primeiro painel (palestra, fala, enfim...) foi do Dr. Dagoberto Calegaro, que falou sobre a prevalência e incidência da EM no país. Eu não o conhecia, mas já tinha ouvido falar sobre ele. Quem tem EM no Brasil há mais de cinco anos já deve ter lido algum artigo dele sobre o tema.
Como vocês sabem, sou uma entusiasta das pesquisas. Acredito que é através delas que vamos pra frente. É por isso que, em outra área, que não a da saúde, que eu trabalho em pesquisa. E é por saber que as pesquisas é que nos mostram novos caminhos e soluções que eu fico muito feliz quando alguém diz que está pesquisando sobre EM. O pessoal do BCTRIMS é entusiasta da pesquisa também, e nos apresentaram alguns dados sobre a EM no país.
Primeiro o dr. Calegaro nos explicou que, pelo Brasil ser um país que teve uma formação bastante heterogênea (veio gente de toda parte do mundo pra cá e se misturou com todo mundo) e isso nos faz um país bastante peculiar para as pesquisas. Temos uma genética variada e diferentes origens.
Além disso, as condições sanitárias e de saúde no país também são bastante diversas. E os hábitos de vida, alimentação, lazer, trabalho, etc, são todos fatores que podem fazer diferença na hora de pesquisar de onde vem e pra onde vai a EM. Para a escolha de tratamentos também.
E o que já se descobriu quando falamos de prevalência e incidência de EM no país?
Primeiro, que não é uma doença tão rara assim. Segundo, que a maior incidência é na região Sul (fomos premiados?). Isso pode ter haver com questões ambientais, genéticas, etc. Outra coisa importante é que existem mais casos de EM nos grandes centros urbanos desenvolvidos.
Conhecer quem são e onde estão as pessoas com EM vai nos ajudar a desenvolver programas de atendimentos para melhorar a qualidade de vida de quem tem EM. Dei uma passadinha no grupo de pesquisa da Epidemiologia da Esclerose Múltipla no Brasil e vi que temos uma porção de pesquisas interessantes sendo feitas por aqui. Pra quem não tem muita intimidade com CNPQ, Lattes, capes, etc, segue o link do Grupo de Pesquisa do BCTRIMS: http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalhegrupo.jsp?grupo=00064011A3DKU6
Aí você encontra os nomes dos pesquisadores desse grupo e, para acessar suas pesquisas individuais e produções, é só entrar no currículo Lattes de cada um. Quem tiver um tempinho, sugiro a leitura desse artigo: http://www.scielo.br/pdf/anp/v60n3B/a37v603b.pdf
A fala dos demais médicos (menos a da dra. Clarice Petramale, representante do Ministério da Saúde, que falou mais sobre o SUSto), foi nesse sentido de promover qualidade de vida e da necessidade de vermos cada pessoa como uma pessoa diferente, com necessidades diferentes e condições de tratamentos diferentes. Principalmente porque a EM se manifesta nas pessoas que estão numa faixa etária muito produtiva, que estão começando suas vidas profissionais, começando suas famílias, pensando em ter filhos, viajar, curtir e mundo, etc...
E, como bem falou a dra. Maria Fernanda Mendes, é uma doença imprevisível. Na verdade todas as doenças são, mas como a EM é oscilante (num dia se está muito bem, no outro se está muito mal), assusta. Muitas pessoas acabam desistindo de seus planos, de seus sonhos, de viver. Realmente, a EM afeta diretamente em nossas vidas. Mas discordo dessa médica quando ela disse que "tem que tocar a vida como se nada tivesse acontecido porque é assim que tem que ser". Eu acho que temos que tocar a vida, mas "como se nada tivesse acontecido" é algo impossível. Talvez ela tenha quisto dizer que não devemos dar toda a importância de nossas vidas nisso. Aí eu concordo plenamente. Mas fazer de conta que nada aconteceu/acontece, é um disparate e, inclusive, uma irresponsabilidade. Mas eu volto a falar das pesquisas da dra. Maria Fernanda num post posterior, junto com algumas palavras sobre cuidado multidisciplinar e família (esse tema merece um texto próprio).
Uma coisa bem importante dita por lá foi sobre os sintomas que não são valorizados. Quer dizer, as vezes a gente sente algumas coisas diferentes e não relata pro médico. Tudo é importante quando falamos de EM! Tudo!
Muitas doenças se parecem com a EM mas não são. Como, por exemplo, a neuromielite óptica, que tem sintomas parecidos mas é uma doença diferente, com características diferentes e tratamento diferente.
Também foi falado sobre as alterações cognitivas, que são pouco valorizadas e bem difíceis de detectar. É aí que entra a necessidade de uma equipe multidisciplinar do atendimento da EM. E, mais uma vez, a importância do médico que acompanha o portador de EM conhecer mesmo esse paciente, para conseguir ver esse tipo de evolução.
Como bem disse a equipe médica presente no evento, cada sintoma diferente exige que o médico procure uma lesão diferente, em um local diferente do cérebro. A EM é uma doença com disseminação tempo-espacial. Isso quer dizer que se apresenta em locais diferentes do cérebro da pessoa, em diferentes espaços de tempo. Muitas vezes, o diagnóstico é feito após muitas lesões que tiveram atividade em tempos diferentes. A importância de "pegar" a doença e diagnosticar o surto é tratar ela quando está em atividade e tentar fazer com que ela pare. Quando se demora muito tempo para diagnosticar, se corre o risco de perder essa fase inflamatória (fase de surtos) e se pega o paciente numa fase progressiva, que não se dá em surtos, mas avança mais rapidamente. Não preciso nem dizer que as formas progressivas causam um estrago maior que as de surto-remissão né?
Por se tratar de uma doença neurológica complexa, de diagnóstico complexo e tratamento complexo, precisamos de profissionais com formação nessa área específica.
As medicações são de alto custo, os exames para o diagnóstico também. Por isso que pesquisas que comprovem que existimos faz com que políticas públicas sejam criadas pensando no nosso bem estar e em melhores condições para o nosso futuro.
É nisso que o campo de pesquisa atua, tentando levar essas informações aos médicos. Porque não temos profissionais tão especializados no Brasil inteiro. Quase nenhum brasileiro tem condições de ir até um centro de referência de tratamento. E em muitos desses centros, existe fila de espera. Mas a doença não espera nada para avançar.
Bom, pra fechar esse texto de hoje (porque a EM se abraçou em mim nesse feriado de uma forma impressionante), quero contar uma boa novidade pros amigos que tem neuromielite óptica e frequentam aqui o blog: estão fazendo diversas pesquisas sobre a prevalência da NMO no país também.
O Dr. Lana citou algumas pesquisas em andamento e que eu aguardo os resultados. Uma delas é da epidemiologia da EM no país. A outra, de diferenças fenotípicas da EM no Brasil. Outra sobre a prevalência da NMO entre as doenças desmielinizantes no Brasil. A, talvez mais esperada, sobre as relações entre níveis de vitamina D e prevalência de EM. Mas a que mais me chamou a atenção foi uma que dizia assim no slide: data de nascimento como fator de risco da EM. Será que é coisa do zodíaco? Hehehehe... Porque por estação do ano é que não é, afinal, inverno aqui no sul não é a mesma coisa que inverno lá no norte do país. Enfim... por via das dúvidas, largo as perguntas aqui, que dia, mês e estação você nasceu amigo (a) esclerosado (a)?
Eu nasci num dia 18 de junho, num inverno atípico aqui no sul, porque não fez muito frio em maio e junho de 1986.
Fico devendo então 3 textos sobre Brasília: sobre os cuidados multidisciplinares, SUS e indústria farmacêutica, certo?
Até mais!
Bjs

P.S. 1: pessoal que pesquisa EM, o congresso anual da BCTRIMS de 2013 vai ser em Belo Horizonte com o tema A doença, o cidadão e o Estado. E em novembro de 2012 tem congresso do LACTRIMS, que é o comitê latinoamericano de pesquisa sobre EM.

P.S.2: ficou linda a foto de despedida de Brasília né? ehehehe

P.S.3: e ainda tem o II Simpósio da AGAPEM, que foi sábado passado e foi muuuuito bom também. Claro que vou falar sobre... mas, uma coisa de cada vez.

15 comentários:

  1. Ei Bruna!

    Muito obrigada por tantas informações!
    Tomara que vc venha no congesso em 2013 aqui em BH, vai ser minha convidada para um café da tarde na minha casa, com pão de queijo, broa de fubá, tudo bem típico de nós mineiros!

    Um abraço,
    Ana Carolina

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    1. Olha, vou cobrar esse banquete hein! Adoro o sotaque e a mesa de vcs...hehehe
      Bjs

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  2. Bruna, mais uma vez muito obrigado por ter estado em Brasília e por trazer-nos tanta informação.

    Um beijo grande,

    Bete

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  3. Oi, Bruna!! Que show este teu post com as informações sobre o encontro e novas pesquisas! Parabéns e agradeço!
    Uma dúvida: sei que somos 35.000 portadores de EM no BR mas tens noção de quantos nós somos no RS?
    Beijos
    Mari

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    1. Eu não tenho esse dado agora em mãos, mas tem uma pesquisa que diz um número aproximado... vou procurar por aqui e te passo.
      Bjs

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  4. Oi Bruna, sempre que leio o seu blog fico mais encantada com tantas informações boas que encontro aqui, esta última então, são ótimas. Parabéns pelo seu blog mais uma vez, e obrigada por existir entre nós.
    Beijos,
    Nélis

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  5. Oi Bruna!
    Só prá variar, adorei o post!!!
    A foto está um show! Coisa de profissional!
    É bom saber que tantas pesquisas estão em andamento, quem sabe numa dessas descobrem a causa desta "encrenca" e a cura da ditacuja.
    Nasci no dia 17 de janeiro, em pleno verão. Sempre amei o verão, o calor, o sol, roupas leves, praia... Mas depois da EM me achar, passei a preferir temperaturas mais frias, pois o calor me faz muito mal.
    Quero muito saber como foi II Simpósio da AGAPEM! Já estou no aguardo.
    Obrigada minha querida, por tua disponibilidade em nos presentear com todo este rico material. Imagino que esteja te dando um trabalhão. Mas tu gooooostia, né?!!
    (✿◠‿◠)
    Beijos com carinho,
    Neyra.

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    1. O Simpósio daqui tb foi mara! Só não foi melhor porque tu não tava lá!
      Logo eu posto...
      Bjaaaaum!

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  6. Oi Bruna...
    Nossa a foto ficou um show mesmo, concordo com vc Neyra...
    Amei seu post... eu fico imaginando como deve ter sido maravilhoso assistir a essas palestras, ficar por dentro do que está sendo pesquisado, conhecer mais pessoas...
    Estou ansiosa pra ler os próximos posts que, com certeza, serão muito informativos...
    Bom, pra constar: sou de 12 de agosto (1982) - é... acabei de fazer 30... crise dos 30 e EM... AHHH SOCORRO!!!! kkkk
    Bjinhos a todos e fiquem com Deus!!!
    Suzana

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    1. Foi mara mesmo! Como disse a Neyra, dá um trabalho, mas eu góstio! Hehehehe
      Bjaaaum

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  7. Ei Bruna!

    Meu nome é Marina e há mais ou menos dois anos tive o diagnóstico de EM! Graças a Deus logo após o início do tratamento e uma pulso nunca mais tive surtos! Mas claro, como todo mundo, passei pela fase de procurar no Google e encontrei mil coisas terríveis! Felizmente, no meio disso tudo encontrei o seu blog!
    É fantástico como vc escreve de forma simples e leve sobre o que queremos saber! Amo os seus textos e admiro sua disponibilidade de sempre trazer novidades e compartilhar sua realidade!

    Ahhhh nasci dia 23/01/86, em BH/MG!

    Obs: A foto de despedida é linda!!!

    Bjinhus

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  8. Prezada Bruna
    Sou farmaceutica e gostaria de saber se voces já ouviram falar no uso de baixas doses de naltrexona na esclerose multipla.
    Att
    Arabela

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    1. Olá Arabela, eu já ouvi e li sobre, mas não o suficiente pra falar sobre esse tratamento. Não conheço ninguém que utilize esse tratamento, nem nenhum neurologista que indique. Bjs

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