sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Quando a esclerose me tirou o "quando"


Oi gentes, blz?
Eu sei... fiquei uma semana sem escrever e alguns se preocuparam achando que eu tivesse derretido. Quase isso... o calor foi tanto nos últimos dias que não tinha energia nem pra ficar sentada digitando. E ontem, que eu pensei em escrever um texto, queimei o dedo na cozinha. Então, ficou pra hoje mesmo.
Bom, mas nessa semana que passou, respondi uma entrevista sobre ter esclerose múltipla que vai sair num site de saúde (assim que sair eu coloco o link) e era voltado ao trabalho e tal. Eu gosto de responder essas entrevistas porque acabam despertando memórias que estavam ali escondidinhas no fundo da gaveta.
Pois bem, uma das perguntas era: Tem alguma coisa que você goste muito, mas que precisou se privar? Como lida com essa falta? 
E essa pergunta veio muito ao encontro de uma pergunta de um leitor do blog, que meio que brigou comigo porque eu nunca fico brava com a EM.
Tá brincando? Eu fico putíssima com a EM quase todos os dias! Mas, enfim, ficar esbravejando não adianta. Nem passar os dias tentando dormir pra vida passar mais rápido, nem fazer coisas que não consigo só pra me frustrar, nem arrancar todo o papel de parede do quarto pra passar o tempo. Já fiz tudo isso e, adivinhem, a EM não me deixou. 
Mas, voltando a pergunta da entrevista, sim e não. Agora momento de volta ao túnel do tempo pra explicar essa resposta.
Eu sempre achei dança uma coisa muito bonita, mas não achava que ficaria legal com roupa de bailarina, era delicado demais pra mim. Quando era bem pequena fiz patinação artística. Depois de muito roxo nos joelhos eu parei. Nunca fui boa em esporte. Só em caçador...porque sou uma exímia fugitiva da bola...hehehehe. Mas eu gostava de dança.
Aí, um belo dia, levando minha irmã à aula de ballet vi uma turma de dança do ventre. As mulheres da turma eram bem mais velhas e ali eu não me sentia mal com meu corpo (eu era meio rechonchuda). Com 12 anos comecei a dançar. E como eu já tinha a altura que tenho hoje, entrei pra companhia de dança de ventre no ano seguinte. 
Eram muitas horas de ensaio, muitas horas de aula, alongamentos, viagens, apresentações. Enfim, era bastante divertido. Às vezes dava uns estresses na companhia por conta de vaidades e picuinhas, mas eu não me metia e ia pela diversão pura. 
Quando eu tive o diagnóstico, eu estava bem fisicamente. Fazia as pulsos e voltava à rotina de ensaios. Mas aí, quando eu tive aquele surto monstro, que me tirou o controle de membros, eu acabei precisando de maior tempo de recuperação. Depois de estar me sentindo melhor, conseguindo ficar de pé e tudo mais, tentei voltar pra dança. Mas se antes eu fazia aulas todos os dias, quando voltei eu não aguentava o ritmo de uma aula inteira. 
Eu ainda conseguia dançar, sabia o ritmo, o movimento, mas meu corpo cansava muito rapidamente e eu vi que eu até poderia dançar de novo, mas não seria como antes. Eu não podia exigir o nível de perfeição que eu exigia antes. E os giros que eu adorava fazer, esses estavam fora de cogitação mesmo.
Na época que eu decidi parar eu tinha uns 17 anos. Foi bem difícil porque era uma mudança de rotina. No início eu não conseguia ver apresentações de dança que eu chorava como uma condenada. Aí, num dia, num acesso de raiva, joguei todos os cds de dança e as medalhas de competições no lixo. Vendi algumas roupas, outra eu dei pra minha prima e da dança do ventre ficaram só uma roupa (a da foto ali embaixo), um par de snujs, algumas fotos e as lembranças.

Então a EM tirou a dança da minha vida? Olhando por esse lado, sim, a EM tirou a dança da minha vida. Pelo menos a dança profissional porque em casa eu to nem aí e danço pras paredes.
Mas, pensando bem, não foi a EM que me tirou a dança. O tempo foi passando, a raiva se amenizou e eu fui me interessando por outras coisas. Com o tempo eu vi que eu ia parar de dançar de qualquer jeito. Com ou sem EM, eu ia acabar deixando essa coisa de dança profissional de lado. 
Então, o que a EM me tirou, de verdade, foi a possibilidade de poder escolher o quando isso aconteceria. Ter que deixar coisas no caminho faz parte da vida, mas a dor me parece ser menor quando é a gente que escolhe o momento de deixar isso pra trás. Me parece mais leve se for a gente a escolher quando é o melhor momento, quando estamos preparados. E quando falamos em doenças, esse quando nunca chega, porque não estamos preparados pra ela. 
Eu parei de culpar a EM pela falta da dança na minha vida há algum tempo já. Apesar de, quando alguém me pergunta concretamente algo que eu gostava e a EM me tirou, eu respondo a dança. Mas lá no fundo eu sei que ela não me tirou isso... ela me deu a oportunidade de aprender que eu não tenho o controle da minha vida. Isso pode parecer ruim para algumas pessoas. Eu acho libertador. 
Lembram quando eu falei, naquele post recente do diagnóstico, que é preciso olhar pro passado com carinho e pro futuro com esperança? Então, acho que tomar a consciência de que eu não controlo tudo me faz ter esse olhar. E hoje eu digo mais: É preciso olhar pro passado com carinho, pro presente com gratidão e pro futuro com esperança. 
Aí entra novamente o rapaz que brigou comigo por eu não ter raiva da EM. Claro que eu tenho. Ela me faz sofrer. Ela faz pessoas que eu amo sofrerem. Ela causa dor. Ela machuca. Ela me incapacita. Mas sempre que eu fiquei só sentindo raiva dela eu sentia mais dor, menos entendimento e não conseguia ver o que tinha de bom para além dela. 
Eu não gosto de ter esclerose múltipla. E desejo que um dia ela não mais exista. Mas eu não posso, nem quero, nem vou gastar meus dias sentindo raiva de algo que eu não posso controlar. Prefiro utilizar esse tempo com amor, carinho, amigos, família. Coisas que me fazem bem. E que me fazem ver que nem toda "perda" é tão ruim assim. 
Até mais!
Bjs

Em tempo: a Tuka, do Ktralhas tá tentando reunir as pessoas com EM de Cachoeira do Sul pra montar um grupo de apoio. Interessados entrem em contato com ela: http://ktralhas.blogspot.com.br/2014/01/rede-de-apoio.html

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Tudo derrete...

Oi queridos, tudo bem com vocês?
Eu cheguei terça à noite em casa, sabendo que ia enfrentar um calorão dos infernos. Quando entrei no avião o piloto disse: dentro de 1 hora e 15 minutos estaremos chegando em Porto Alegre, que é, pelo terceiro dia consecutivo, a capital mais quente do país. Deu vontade de ir pro sertão pra fugir do calor... hehehehe.
Chegamos e o termômetro marcada 35 graus às dez horas da noite. Tem cabimento um negócio desses? O verão por aqui é quente sempre, mas depois que baixa o sol costumava refrescar. Agora essa loucura. E aí, já sabem né, a fadiga vem e abraça meu corpo todinho. Dói do fio de cabelo até o dedo mindinho do pé. É uma sensação péssima.
Tô quase dizendo pras pessoas só me convidarem pra qualquer coisa quando chegar o outono. Porque como diz uma piadinha que tá rolando aí no facebook, aqui em Porto Alegre existe uma nova estação do ano, a EUTONO: Eutono inferno!
Dizem os meteorologistas que amanhã vem uma massa de ar polar e vai refrescar. Assim espero... não guento mais comer gelo pra ver se refresca. E a conta de luz... bom, sem comentários sobre a conta de luz.
Tomando um vento: EXPECTATIVA

Tomando um vento: REALIDADE

Eu tava aqui catando sobre o calor, fadiga (textos antigos pra ajudar quem tá no seu primeiro verão com EM) e encontrei o nome bonito pra esse calor que nos deixa com cara de zumbi do the walkind dead: fenômeno (ou síndrome) de Uthoff.
Bom, eu tenho intolerância a temperaturas extremas, o frio extremo me derruba e me causa muito dor e o calor extremo acaba até com a minha capacidade de raciocinar. E isso tem uma explicação: quem tem EM tem uma destruição da mielina, que levam os impulsos nervosos pro corpo todo. Quando a bainha de mielina tá avariada, esses impulsos chegam "atrasados". Quando há uma variação de temperatura do corpo (nem precisa ser muito, pode ser de 1 ou 2 graus), esses impulsos atrasam mais ainda. E é por isso que mais ou menos 40% das pessoas que tem lesões na bainha de mielina tem intolerância ao calor.
E eu que não tinha fadiga nos primeiros 5 anos de diagnóstico, tô sentindo tudo com juros agora. O calor tá derretendo tudo, até as minhas ideias...
Mas, nem tudo é o mundo derretendo nos últimos dias.
Cheguei em casa e tinha duas coisinhas pra mim na caixa do correio (adoro receber cartinhas no correio...presentes então, nem se fala).
A AME - Amigos Múltiplos pela Esclerose me enviou uma camiseta que eu ganhei numa promoção no facebook. Linda! Adorei! Ah, vocês já me viram usando a camiseta, porque é igual as que eu usei durante o ONG Brasil. Só que as minhas ganharam novas donas aqui em casa: minha mãe e minha prima. E eu fiquei sem... aí, participando da promoção do fim de ano, garanti uma pra mim. Logo logo vai estar disponível na lojinha da AME. E se você ainda não curtiu a AME no facebook, tá aí o endereço: https://www.facebook.com/amigosmultiplos?ref=ts&fref=ts
Vai que você ganha a próxima promoção hein?
E dentro dum envelope, veio a nova edição do livro do meu amigo Rodrigo Drubi. Querido amigo que conheci pessoalmente na nossa viagem à Dinamarca. E olha só, esse danado me fez chorar com o livro... não é que ele colocou na capa uma árvore, fazendo alusão a uma linda árvore que eu queria trazer no bolso lá da Dinamarca, mas na impossibilidade disso, trouxe no coração e na memória. Se fecho os olhos e me concentro, escuto o barulho das suas folhas ao vento. Sinto o vento que soprava lá no meu rosto (e sentir vento nesse calor tá fazendo bem demais). É uma coisa inexplicável. Só quem estava lá naquele momento pra lembrar, né Rodrigo? Muito obrigada pelo carinho, pela lembrança, e pela honra de me deixar escrever algumas linhas do prefácio da tua obra. Ah, Rodrigo, coloca aí nos comentários como é que o povo faz pra adquirir o livro?
Olhem que lindos os meus presentes:


Bom, e pra quem está derretendo como eu, algumas dicas dos verões passados:
1. O que causa a fadiga e o que fazer com ela:
http://esclerosemultiplaeeu.blogspot.com.br/2011/11/verao-e-fadiga-parte-1.html
http://esclerosemultiplaeeu.blogspot.com.br/2011/11/verao-e-fadiga-parte-2.html
2. O colete térmico pra refrescar os corpinhos (que em 2010 eu achava mó cafona e agora eu até toparia usar esse negócio...)
http://esclerosemultiplaeeu.blogspot.com.br/2010/01/vestido-de-picole.html
Pra refrescar tá valendo roubar ar condicionado no shopping (e no banco, nos correios, no supermercado...), comer pedra de gelo, chupar picolé (de preferência os de água), sacolé, tomar suco e água gelada, colocar paninho úmido gelado nos pulsos e na nuca, banho gelado, ficar na frente do ventilador, colocar gelo na frente do ventilador pra refrescar mais o ambiente... e o que mais a criatividade lembrar...
Até mais!
Bjs

domingo, 19 de janeiro de 2014

Como lidar com o diagnóstico?


Oi queridos, tudo bem com vocês?
Há alguns dias vi um vídeo sobre o diagnóstico de EM e fiquei pensando sobre ele, sobre o meu diagnóstico, sobre os muitos emails que recebo todos os dias me contando seus diagnósticos.
É incrível a diversidade de reações que existem para esse momento. O momento em que o médico diz: o que você tem é ESCLEROSE MÚLTIPLA!
No meu caso ele não disse, ele escreveu num papel e mostrou pra mim e pra minha mãe, que estava sentada ao meu lado. Na hora eu pensei (desculpem o palavreado, mas não tem outro jeito de descrever): essa merda deve ser foda, pro cara nem falar o nome...
Eu entendo que pra ele deve ter sido difícil me diagnosticar com EM. Ele me conhecia desde os 12, conhecia meus pais desde sempre e de repente dizer pra uma menina de 14 anos que tinha esclerose múltipla, numa época em que só tínhamos 3 remédios disponíveis e como eu tinha menos de 18 anos só podia testar dois. Realmente Dr. César, eu também escreveria.
Bom, mas voltando ao vídeo (link logo ali abaixo), vi as diversas reações que leio todas as semanas: algumas pessoas se entristecem muito, porque acham que não mereciam ter a doença. Sinceramente meus amigos, ninguém merece, mas doença não é uma questão de merecimento. Nascemos com um corpo igual ao de todos, suscetível a doenças como todos e, por alguma falha ou disfunção desse corpo, temos uma doença. Ponto. É isso, e não merecimento.
Outras pessoas se desesperam e ficam se perguntando "Porque eu?". Tem uma senhora no vídeo que diz que todos se perguntam "porque eu?". Sinceramente, eu nunca perguntei porque eu. Não sei se é porque cresci conhecendo muita gente com doenças das mais diversas (não se esqueçam, a clínica de fisioterapia dos meus pais era meu parque de diversões), mas eu sempre pensei, "porque não eu?". Há alguns dias uma menina me enviou um email dizendo exatamente que estava se perguntando "porque eu?" e eu perguntei a ela o que ela tinha de tão especial e extraordinário que a faria imune a uma doença. Não sei se ela gostou da resposta, mas é assim que eu vejo. Se todos podemos ter uma doença, porque eu não teria nadica de nada?
Outras acham que têm a doença é alguma missão divina. Eu, sinceramente, procuro não achar sentidos do porque ou para que ter a doença.
Eu tenho a doença porque tenho um corpo humano, frágil e suscetível à enfermidades. Quero que descubram o que causa essa doença para que saibamos evitá-la. E adoraria que encontrassem um cura porque viver com ela é muito difícil, é sofrido, exige muitos cuidados, adaptações, adequações e mudanças que nem sempre queremos fazer. Mas já que eu a tenho, a única coisa com a qual eu me preocupo é o que fazer com ela. É viver com ela. E não viver pra ela nem por ela. Ela já ocupa demais minha cabeça e meu coração com aquilo que ela provoca, eu é que não vou ficar catando os motivos dela existir, fazendo ela ser maior ainda do que já é.
Não dá para ignorá-la. Seria muita burrice. Mas não dá pra supervalorizar. Ela vai ganhar de mim apenas o valor que ela tem.
E qual o valor que ela tem? Então, vai depender de que fase eu e ela nos encontramos. Nós sabemos que ter EM é viver numa montanha-russa.
Pulando essa fase de porque eu, pra que, etc e tal, tem as pessoas que se sentem aliviadas com o diagnóstico. Se sentem aliviadas porque já passaram por tantos médicos, tantos exames, tantos diagnósticos diferentes que quando ganham um rótulo sentem o alívio de poder dizer o que tem, como tratar, que ajuda procurar.
Voltando ao meu diagnóstico, fiquei tentando lembrar qual foi o meu sentimento quando fui diagnosticada. Eu lembro do dia, de como foi, que eu saí do consultório e fui pro hospital marcar a pulso, de chegar em casa e encher a minha mãe de perguntas, de esperar dar dez horas da noite pra ligar a internet e ver o que dizia na rede (lembram da internet discada, que era mais barata depois das dez né? hehehehe). Mas não lembro de ter sentido raiva, tristeza, medo, alívio, nada. Fiquei pensando se eu tinha bloqueado essa memória e liguei pra minha mãe. Ela me confirmou que eu fiquei muito tranquila, só bastante curiosa. Eu queria saber tudo sobre a EM. Eu queria saber tudo sobre essa coisa que ia ficar comigo a partir daquele momento.
Acho que aceitei com certa facilidade o diagnóstico. O que eu não aceito muito bem, até hoje, são os novos surtos. O surto pra mim é sentido como um fracasso sabe. E acho que o momento em que a EM me deixou mais triste foi quando eu tive um surto fenomenal, que me tirou o controle de braços, pernas e visão, tudo ao mesmo tempo. E eu sentia tanta dor, me senti tão mal que cheguei a pensar se não era melhor eu não existir. Isso foi dois anos depois do diagnóstico. E, claro, a cada novo surto é um sentimento de fracasso.
Mas quando a gente recebe o diagnóstico, ele não afeta apenas a gente. Ele envolve todos que estão conosco e que precisam entender essa doença, nossos novos limites, nossas necessidades. E aí a coisa complica um pouco. Complica porque no início nem a gente sabe descrever o que sente. Mas com o tempo e os sintomas pegando, a gente acaba aceitando a doença. E na maioria das vezes a gente aceita ela muito antes dos outros. Porque é a gente que tá sentindo ela não é?
Nossos pais, avós, amigos, namorados, esposas, etc não conseguem sentir o que estamos sentindo. Não conseguem entender o que é aquilo. Alguns tentam minimizar a doença dizendo que logo ela vai passar, que vão descobrir a cura, que isso não é nada. E não percebem que, com essas palavras estão dizendo: eu não aceito que você esteja assim, isso tem que mudar, isso não te define. É verdade que isso não nos define, mas faz parte de quem somos, então, é melhor meus caros amigos que são amigos e familiares de quem tem EM, é melhor aceitar que é uma doença sim, que é grave sim, que exige cuidados específicos sim e que causa muito sofrimento. Não é feio ficar triste. Mas querer que as coisas voltem a ser do jeito que eram antes não resolve. Pelo contrário, só atrapalha porque, não adianta, as coisas não serão como eram antes.
E pra gente é complicado aceitar esse fato também. Aceitar que a vida de todo mundo continua o rumo que tinha antes e a sua não. Que seus planos, de repente foram suspensos. Que tudo precisa ser reorganizado. Que seu corpo não é mais o mesmo corpo. E que tudo parece continuar andando normalmente enquanto você quer que o mundo pare para que você se entende e ele entenda você. É complicado, mas o mundo não para.
E sabe que às vezes, nesse processo de se entender a gente acada sendo rude com quem tá tentando ajudar. Mas não é por maldade não. Eu sei que cada banho que minha mãe me dava, mesmo eu tendo 18 anos na cara, era cheio de carinho e não de piedade, mas saber disso não tirava a minha dor. Gritar "mãe, vem limpar" (e ajudar a levantar, e colocar a calça e ir sentar em outro lugar) não tem a mesma graça que tinha quando tínhamos 4 ou 5 anos. Não poder ir chorar escondida no banheiro, depender de alguém até pra limpar o ranho do choro faz com que a gente não enxergue que quem faz aquilo faz por amor. A dor cega às vezes. E assim como a gente quer que tenham paciência com a nossa dor, a gente tem que ter compaixão pela dor do outro.
Eu fico extremamente triste quando recebo emails dizendo que a família acha que a doença é charme (pasmem, não são poucos). Eu não consigo dimensionar a dor que vocês sentem porque se já é difícil com o apoio da família, sem ele deve ser insuportável. Juro, tenho vontade de levantar da cadeira e ir aí dar um abraço. Eu sei que meu abraço não resolve o problema, mas carinho sempre faz bem né...
Mas, fica muito feliz quando recebo emails de amigos, familiares, namorados, esposas, conhecidos, sei lá, perguntando o que fazer pra ajudar uma pessoa que ama e que tem EM. Fico feliz porque essas pessoas estão se preocupando, e isso já é uma grande coisa. E a verdade é que não tem receita pra como lidar. Porque pra cada pessoa é diferente. E, adivinhem só, mesmo quem já passou por isso, não sabe exatamente o que fazer quando alguém que a gente ama tá passando.
Eu tenho aprendido muito como é estar do outro lado agora. Eu tenho feito com meu namorado tudo aquilo que eu achava ruim quando faziam comigo. Só quando se sente essa impotência é que se entende que o cuidado não é super proteção, nem pena. É amor.
Eu sei que a dor, o sofrimento, a mudança nos provoca uma certa rabugice. Eu fui a rainha da rabugice. Eu sei como eu fui rude algumas vezes. E quanto eu não soube devolver todo o carinho que me davam, mesmo reconhecendo esse carinho, precisando e adorando receber. Sério, meus queridos amigos que nos acompanham, a gente sabe e reconhece, só que às vezes não consegue externalizar, agradecer. E vocês não imaginam o quanto a gente se sente culpado por isso.
E aí a EM faz com que os dois lados fiquem se sentindo mal. Quem cuida porque acha que nunca é bom o suficiente pra fazer quem tem a doença se sentir um pouquinho melhor. E quem está sendo cuidado porque acha que está atrapalhando, porque está se sentindo impotente. Na verdade há um sentimento de impotência dos dois lados.
E o que eu vou falar agora não é nada alentador: realmente não há muito o que se possa fazer. É necessário passar por todas as fases pra poder se aceitar. É necessário que os dois lados passem por essa transformação. Fugir disso não funciona. É como o luto, você precisa passar por ele, por mais doloroso que possa ser. É um luto. E, como em qualquer luto, ninguém sabe exatamente o que fazer, o que falar, como agir. E fazemos coisas que depois até nos arrependemos. Mas assim a gente aprende.
E, a parte alentadora é que, depois que essa fase passa (sim, é uma fase e sim, passa), as relações se tornam melhores. Há mais cumplicidade, respeito e lealdade. E aqueles que somem nessa fase (sim, porque alguns pais, mães, filhos, amigos somem nessa fase...uns voltam depois, outros não voltam jamais), é porque não tinham capacidade ou vontade de passar por essa transformação.
O diagnóstico é isso, um processo de transformação. De morte e de nascimento. E como toda transformação exige esforço, vontade, carinho, dedicação, paciência, coragem, amor.
Eu sempre faço a comparação do diagnóstico com uma mudança de cidade. Quando eu tinha 12 anos eu me mudei de cidade. Achei que ia morrer sem meus amigos, minha escola, minhas ruas, meus hábitos na nova cidade. Achava que eu nunca mais ia ter amigos... aquele exagero típico de pré-adolescente. Depois do choque de me mudar, fui me acostumando com as novas ruas, conheci gente nova, fiz novos amigos, criei novos hábitos, recriei minha vida. Claro que eu sentia saudades do que eu tinha vivido, e me doía saber que meus antigos amigos continuavam a vida deles, sem eu estar lá. Mas a vida seguiu e hoje eu voltei a ter contato com aqueles amigos, agora uma relação nova, diferente, apesar de sermos as mesmas pessoas (ou não, hoje somos nossa versão melhorada). Com a EM é a mesma coisa. No início é muito dolorido saber que a vida de todos seguem como se nada tivesse acontecido. Mas com o tempo a gente vai se acostumando com o novo corpo, a nova vida e até consegue olhar só com carinho e não com pesar pro passado. É libertador poder olhar pro passado com carinho e pro futuro com esperança. Mas isso exige tempo, coragem e paciência. E amor daqueles que nos rodeiam, porque não é bolinho não.
Viver com a EM não é uma escolha, mas como viver com ela é. Minha mamis sempre me disse que se a gente escolhe olhar o mundo com um óculos de lentes vermelhas, tudo vai ser vermelho. E mesmo que se goste muito do vermelho, você acaba perdendo a oportunidade de enxergar a beleza das outras cores e de, quem sabe, até gostar delas.
Ah, e pra muitas pessoas a EM é uma forma de olhar pras coisas que realmente importam, de parar e fazer aquilo que realmente gostam. Eu acho que todos deveriam fazer isso sempre, com ou sem EM, mas às vezes só tomando um susto desses é que se repensa os valores. E isso quem proporciona não é a EM, é você mesmo. É você que escolhe olhar e fazer o que ama. Valorizar aquilo que realmente te importa. Isso já estava dentro de você, já era você antes do diagnóstico. Talvez o que a EM tenha feito é dar um empurrãozinho, certo?
Tudo isso só pra dizer que não tem receita do que fazer, como agir, de certo ou errado. Por isso que eu continuo errando na esperança de no fundo estar fazendo certo. É clichê e brega, mas talvez o certo seja fazer o que diz seu coração.
E você, se sentiu como quando foi diagnosticado?
Curtam o vídeo e me contem ali nos comentários:



Até mais!
Bjs

domingo, 12 de janeiro de 2014

Sobre a menina com autismo da novela

Reproduzindo o que escrevi no facebook sobre a personagem da novela:

A novela é uma porcaria, mas pior ainda são os comentários que tô lendo por aí...
(desabafo de quem estuda -deficiência e telenovela - e vive isso todos os dias)
Tô vendo uma cambada de gente aí comentando a personagem autista da novela das nove. E dizendo que as pessoas tem preconceito por não deixar o tal do Rafael beijar a Linda. Bom, minha gente, até onde eu sei a Linda representa uma menina autista, com sérios comprometimentos e legalmente interditada. Isso quer dizer que ela não tem condições de discernir muitas coisas nem de assumir consequências de um relacionamento. Claro que ela tem sentimentos e pode sim gostar de um homem. Mas dizer que os pais estão errados porque não querem esse relacionamento é algo complicado. Do ponto de vista legal, é como você deixar seu filho de 5 anos se relacionar com um adulto. Não vejo a novela, vi só o pedaço do capítulo depois de ver comentários do tipo "a família dela é preconceituosa". Não sei como são os personagens fora dessa cena, mas vamos analisar o fato colocado em pauta de discussão.A questão não é tão simples como se apresenta na novela não. Não se enganem. Culpar a mãe por não saber criar a filha é fácil. Quero ver criar uma pessoa com deficiência intelectual em casa.Digo por experiência própria aqui de casa que falar é absurdamente fácil. Mas na hora que é com alguém que a gente ama a coisa muda.Tenho uma amiga que sempre diz "eu era uma ótima mãe, até ter meu filho".Já vi muita gente dizer que a minha mãe é super protetora e que a minha irmã não é mais independente porque a gente não deixa.Lógico que as mesmas pessoas não passaram nem 24h com a gente pra saber que a mana não tem capacidade pra atravessar a rua sozinha. Nem pra saber que se a gente não trocar a roupa dela, ela vai andar com a roupa suja e vai achar que está tudo bem. E não é por falta de tentar ensinar, de deixar pra ver o que acontece e de desespero nosso não. Deixá-la sozinha é uma irresponsabilidade tão grande quanto deixar uma criança de 5 anos. Não, ela não tem 5 anos, nem a tratamos como se tivesse, mas temos que agir pensando que mesmo tendo 30, sua capacidade cognitiva não é o da maioria das pessoas de 30. Querer achar que é tudo a mesma coisa e tratar da mesmíssima forma que eu trataria qualquer pessoa de 30, isso sim é excludente, seria cruel e preconceituoso, pois ela jamais atingiria as expectativas que temos de uma pessoa de 30. Uma coisa que vocês, que estão aí dizendo um zilhão de bobagens não entendem, é que a capacidade de análise de riscos, consequências e mesmo de projetar o futuro de uma pessoa com autismo, deficiências intelectuais e/ou algumas doenças mentais é alterada. E que não se pode analisar esses fatos a partir de uma visão romântica e desassociada do contexto em que essa pessoa vive. Antes de falarem, pelamordedeus, pensem!O que falta nas novelas é justamente o pensamento profundo, a discussão séria sobre as coisas. Se a sociedade aceitar esse raciocínio raso sem questionar, sem discutir, fica difícil né.Mas sabe o que é mais triste? Ver gente que diz aí todos os dias que tá lutando pela conscientização das pessoas sobre suas doenças/deficiências e na hora de falar da condição do outro não vai atrás de informação que preste. CHEGA DE LUGAR COMUM!


#prontofalei

Então, algumas pessoas acham que o problema é a falta de desenvolvimento dela, certo? Sim, ela talvez poderia ter se desenvolvido mais. Mas o fato é que ela não se desenvolveu. E devemos lidar com o que está acontecendo e não com o que poderia ter acontecido. O fato é que a personagem não tem essa capacidade. Pode desenvolver? Talvez sim, mas tem que esperar isso acontecer para daí sim ver o que acontece. Dizer que a menina não se desenvolveu por falta de apoio da família é como dizer que eu não me curo por falta de força de vontade. Mesmo que seja por falta de informação da família, culpar pessoas que já estão sofrendo pelo próprio sofrimento é no mínimo cruel. Claro que existem casos e casos, mas esse caso mostra uma menina que está sim incapaz. Claro que é uma obra de ficção, mas como obra de ficção num meio de comunicação de massa, deveria ter um compromisso social. Não podemos concordar que um produto como esse continue perpetuando estigmas e estereótipos. E como se trata de um problema mental, as pessoas acham que é só falta de força de vontade mesmo. Queria ver se eles colocassem que a culpa da Paulinha ter Lúpus era porque ela era adotada...aí o grito ia ser grande, né? A verdade é que as pessoas pouco entendem sobre os problemas mentais. Inclusive os médicos. E quanto menos se entende, mais bobagens se permite falar sobre.

Além do mais, não cabe a mim, nem a ninguém julgar a forma como uma família lida com isso. Afinal, todo mundo sabe melhor como lidar com a minha esclerose né? Todo mundo sabe melhor como lidar com uma doença que não é sua. Acho o seguinte, não sabe o que falar, fica quieto. Imagino que seja muito tentador achar essa história o Romeu e Julieta do século XXI, mas vamos colocar a cabeça pra funcionar. Vamos nos colocar no lugar de quem passa. Sim, existem autistas com condições de vida autônoma, mas não é o caso da personagem apresentada. Então, que tal parar de dizer que todo autista que não é independente é por culpa da família? Que tal deixar essa crueldade de lado? Que tal termos mais compaixão?
Porque mesmo quem fala: fica claro que foi falta de apoio da família! Bom, mesmo sendo ficção, telenovela, não aparece a vida inteira dos personagens, desde o nascimento, 24h por dia do que aconteceu até aqui, certo? 
Nós e essa nossa incrível mania de achar que conhecemos tudo da vida do outros e, por isso, podemos julgar.
E que tal pararmos de aceitar representações ruins de doer? Olha, nem vou comentar a representação do Antônio Fagundes cego porque aí sim a coisa vai feder...

E quem quiser entender um pouquinho mais sobre representações, estigma e telenovela, sugiro a leitura da minha dissertação de mestrado: http://tede.pucrs.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=4035

Beijinho no ombro!

Um upgrade no post, deem uma olhada nesse post aqui que tá massa: http://scienceblogs.com.br/odiva/2014/01/e-a-moca-autista-da-novela-heim/?fb_action_ids=10200544896544221&fb_action_types=og.likes&fb_source=other_multiline&action_object_map=%5B626901574022919%5D&action_type_map=%5B%22og.likes%22%5D&action_ref_map=%5B%5D

sábado, 11 de janeiro de 2014

Fampyra, seu lindo, seja bem vindo ao Brasil!!!


Oi queridos, tudo bem com vocês?
Ontem eu fui lá visitar a minha neuro querida, dizer como eu estava, o que eu aprontei de novembro pra cá e ver se ela resolvia meus problemas...ehehehe.
E vim da consulta com boas novidades.
Bom, primeiro a novidade que todos querem saber: sim, o Fampyra já está à venda no Brasil! Uma caixa custa em média R$500,00, mas o tratamento mensal deve ficar uns mil pila mesmo. É um valor alto, claro, mas pra quem tá precisando, vale a pena fazer o investimento pelo menos na caixa de teste. Porque se o negócio funcionar, dá pra entrar com ação judicial pra conseguir a medicação.
Se você estiver com problemas graves de marcha, converse com seu médico porque os resultados desse remédio tem sido de deixar o queixo caído.
Tem um porém, nem todo mundo se beneficia com ele. Há um período aí de pelo menos 15 dias para ver se ele está dando resultado ou não. Se nesse período não der, é provável que ele não funcione pra você.
Então, como essa medicação tá cara, eu peço às pessoas que comprarem e não forem continuar o uso, que doem o restante da medicação às associações de EM para que elas repassem às pessoas que precisam testar mas não tem condições financeiras de fazer isso. Vamos nos ajudar aí gente!
Mas, sinceramente, espero só ler comentários bons, de que a medicação fez efeito. Quem quiser dar uma olhada na bula: http://www.anvisa.gov.br/datavisa/fila_bula/frmVisualizarBula.asp?pNuTransacao=8226022013&pIdAnexo=1810817
Ah, e não está à venda em farmácias, só em distribuidoras de medicação. Fiquei sabendo de três lugares (provavelmente existam outros) que estão vendendo:
Oncoprod - http://www.oncoprod.com/
SAR - http://www.sar.com.br/br/
OncoImport - http://www.oncoimport.com.br/
Não é uma ótima notícia? O ano mal começou e já chegou com essa surpresa linda!
Quem estiver tomando, por favor, mande um email contando a sua experiência pra eu poder postar aqui? (bruna.rochasilveira@gmail.com).
Bom, além de vibrar com essa novidade que vai ajudar tanta gente, saí de lá com duas receitas novas. Minha lista de compras na farmácia tá quase maior que a do supermercado aqui de casa...ehehheheh
Antes que perguntem, pra que eu tomo tanto remédio, vamos lá:
Avonex pra EM, dois pro hipotireoidismo (que tá super bem controlado), um pro tremor das mãos, um pra fadiga, um pra artrose dos joelhos e a reposição de vitamina D (só quando precisa).
Agora tô com mais dois na listinha.
Eu ando tendo muito enjoo e nausea depois do almoço. Mesmo comendo pouco. E o pior é que baixa um monte a pressão e eu fico atirada, morrendo no sofá. Muito desagradável. Ganhei um remédinho porque isso pode ser algum tipo de refluxo. Torcendo pra que funcione.
Além disso, contei pra doutora que faz mais ou menos duas semanas que eu acordo no meio da noite com dor nas pernas e de manhã, quando tenho que levantar, a dor no corpo é tanta que fico presa na cama. Ok, às vezes é preguiça de sair da cama...mas eu sei diferenciar dor de preguiça e ultimamente tem sido a dor a culpada.
Ela desconfia que meus músculos não estejam conseguindo relaxar. Eu também. Tenho tido muitos espasmos nas pernas e braços. Fazia muito tempo que a minha mão não ficava tão boba. De vez em quando ela "pula" sabe. Desagradável. E a perna fica fibrilando tão forte que dá pra ver. Hoje eu mostrei pra mãe e ela me disse o nome bonito disso: mioclonia. Ela pode ser causada por estafa. Muita gente tem isso enquanto dorme. Mas a minha é causada por esse cérebro avariado mesmo.
Bom, o que importa é que comecei a tomar o remédio pra evitar que isso se torne uma espasticidade. E pra conseguir dormir direito de novo. Porque dor e sono não combinam nem um pouco.
E os donos de farmácia vibram com a minha listinha...hehehehehehe. Haja bolsa pra comprar tudo isso. Mas, já que funciona, melhor comprar. Porque só estou boa assim porque existem essas
droguinhas do bem.
Novidades contadas, vou dar uma descansada. Esse calor, mais o sono acumulado, mais o cansaço de ter trabalhado a semana toda (me puxei nos últimos dias), me deixaram assim, diva demais.
Aproveitem o final de semana crianças!
Até mais!
Bjs

P.S.: ah, acabei o A culpa é das estrelas e fiquei doida pra escrever um post sobre ele... semana que vem eu conto, sem contar o final da história, claro ;)

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

"Ninguém é doente por charme"

Oi gentes, tudo bem com vocês?
Por aqui tudo bem... um calor desgraçado, uma fadiga que não vai embora, mas tá tudo sob controle. Ou nem tanto sob controle, mas ainda não bateu o desespero...
Bom, mas hoje estava eu lendo o jornal quando me deparei com a crônica do Carpinejar que me fez voltar aos tempos de escola. Ele escreve sobre uma coleguinha que ele teve, que tinha alguma doença certamente, pois vivia desmaiando. E ele conta como sentia inveja dela... puro egoísmo adolescente, achando que a menina "fazia um charme", que era bacana ter as atenções todas voltadas a ela. Logo ali abaixo você pode ler a crônica que eu copiei pra cá.
Mas antes queria dizer que ter EM na época da escola foi um inferno. Simplesmente porque é um inferno ser o ET da sala. Antes da EM eu era apenas mais uma CDF da sala. Depois da EM eu virei assunto da sala, porque era a doentinha, coitada. Mas sabe, meus colegas não eram só egoístas como o próprio Carpinejar conta na crônica. Nem achavam, sei lá, interessante a colega ter seus problemas e ataques. Minha turma era bem cruel. Cruel daqueles que culpam a pessoa pela doença, que chamam de preguiçosa o tempo inteiro, que acham que você não vale absolutamente nada porque tem uma doença. De aluna brilhante e promissora eu virei aquela que se acabasse a escola já tava no lucro. Ah se eu tivesse os poderes de Carrie, a Estranha...aquela escola ia pegar fogo... hahahahahah.
Mas é estranho, as pessoas veem uma certa aura de charme na doença. Pior ainda aqueles que dizem "ah, mas tu podes usar a desculpa da doença...". Até parece que a gente adora ter uma doença, só pra poder se desculpar de atrasos e ausências. Não sabem eles que tudo que a gente queria, às vezes, era ter o pique de trabalhar um dia inteirinho. Bom, mas deixo vocês com as palavras do Carpinejar, que estão muito boas. Parabéns Carpinejar, por assumir o que sentiu e, principalmente, por ter aprendido a respeitar o sofrimento alheio e a entender a alma do outro, sentimento chamado também de compaixão...falta muito nesse mundo.
Até mais!
Bjs

SOFRIMENTO NÃO É CHARME

Em minha escola, havia a Maria do Suspiro. Um nome que funcionava como apelido amoroso.
Ela desmaiava semana sim, semana não.
Produzia um acontecimento importante na turma, com descrições de como foi a queda, os passos para reanimá-la, quem a socorreu.
Destacava-se como uma santa na lista de chamada. Se o tombo ocorria antes do recreio, dominava o assunto das rodas no intervalo. Se ocorria depois, não se falava de outra coisa na saída.
Assim que acordava da pane, Maria Suspiro recebia biscoitos, bolo e chá, recebia cuidado e atenção especial dos professores, recebia uma hora exclusiva na sala da direção, e recebia – pasmem – a chance de sair mais cedo.
Passei a minha infância inteira treinando desmaiar. Mas não consegui.
Eu me sobrecarregava de roupas no verão. Botava uniforme com gola rolê. Só que minha pressão não baixava. Eu apenas ficava com a fama de excêntrico.
Sobrevivia um dia jantando ninharias e renunciando o café. Só que a fome apenas produzia barulhos no estômago.
Sofria de amores platônicos, me distraía e jamais me esgotava emocionalmente.
Gostaria mesmo de desmaiar. Ensaiava tonturas na cama. Mas logo me despertava mais animado ainda.
Idealizava o copo inesperado de água com açúcar e os colegas ao meu redor, perguntando se estava bem e se havia recuperado a consciência.
Ansiava por aquela vertigem de amolecer os ombros e se dobrar como água de cachoeira.
Busquei desmaiar na igreja e somente cochilei. Busquei desmaiar na aula de matemática e somente ronquei. Além de não desfalecer, ganhava advertências e ocorrências que sujavam o histórico escolar. Minha saúde perfeita não ajudava a alma romântica. Ganhei a fama de malandro e espertinho, preguiçoso e inconveniente.
Já Maria do Suspiro tinha uma performance impressionante, inimitável. Não compreendia como ela sempre caía bonito, nunca batia com a cabeça ou se esborrachava no chão. Não se machucava, não criava cicatrizes. Ela virava os olhos, empurrava o rosto para trás, e se escorava em alguém ao seu lado, que amparava imediatamente sua frouxidão. Não a vi caindo uma vez desacompanhada. Tinha um senso infalível de momento. Não descia a escada da respiração sem um corrimão ou desprovida do apoio de um braço generoso.
Seus desmaios eram educados, gentis, sedutores. Nem demorados para gerar pânico. Nem rápidos demais para não provocar dúvidas.
Por muito tempo, fui apaixonado pela minha carência. Forçava adoecer para chamar atenção. Enquanto Maria do Suspiro sonhava com a paz de minha vida, com a normalidade discreta dos colegas.
Ninguém é doente por charme. Entendo talvez um pouco tarde. Hoje respeito mais a fraqueza dela do que o meu egoísmo.
Publicado no jornal Zero HoraColuna semanal, p. 2, 7/1/2014Porto Alegre (RS), Edição N° 17666


sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Ano novo, geladeira nova

Oi queridos, tudo bem com vocês?
Como foi a passagem de ano?
A minha foi muito feliz! Cheia de alegria e amor!
E cheia de altas temperaturas também. Aqui em Porto Alegre fez um calorão desgraçado. A última semana de dezembro foi passada dentro de casa, com o ar condicionado ligado 24h, direto.
Bom, e com o calorão que fez, não foi só eu que fiquei exausta não... a nossa geladeirinha, que já tinha uns 15 anos de trabalho, cansou também.
No início a gente achou que ela só tava era sentindo que tinha comida demais...ceia de natal, ceia de ano novo... mas depois a gente viu que não dava mais mesmo. E aí bateu o desespero: e esses remédios????? O que mais me incomoda na medicação nem é o fato de ser injetável, mas essa coisa de refrigeração me tira o sono às vezes.
Resultado que ontem eu e a mãe saímos bater perna pra encontrar uma geladeira nova. Porque estragar comida até dá, mas estragar o avonex, nem pensar!
Aí fiquei pensando que, quem tem medicação que precisa de refrigeração, tem que ter sempre uma "poupança geladeira", porque nunca se sabe quando a geladeira vai dar pau e te deixar na mão.
O bom de bater perna em shopping é que tem ar condicionado. Então nem posso reclamar de ter passado calor. Mas como cansa...
E pra compensar o cansaço, duas coisas boas extras, além de comprar nossa Brastemp frost free: encontrei a queridona da Neyra no mercado e pude dar um abração de feliz ano novo nela e na mamis dela também. E, eu e a mãe resolvemos nos livrar da nossa tv vintage, de tubo, e trouxemos também uma tv nova pra casa. Uma dessas smart tv, de led e com quinhentas e cinquenta e uma funções que nunca saberemos usar...ehehhehe.
Começamos bem o ano, com tv e geladeira novas. Porque vida nova eu não preciso, tô muito satisfeita com a minha. Feliz demais pra querer trocar.
Ah, e tem notícia fresquinha também sobre medicação de EM no Brasil...só tô me informando melhor pra passar a informação correta pra vocês nos próximos dias. 2014 promete!
Eu não sou de fazer resoluções para o ano. Eu trabalho bem com metas, mas que não obedecem, necessariamente a ordem do ano comum. Mas, comecei o ano com uma promessa pra mim mesma, tenho que sentar a bunda e escrever boa parte da minha teses nesses primeiros meses. Então, se eu demorar pra responder emails, vocês já sabem o motivo.
E outra promessa é a de manter o blog com pelo menos 2 textos por semana. Se eu começar a não cumprir, me cobrem!
Até mais!
Bjs